Vamos estudar aqui quatro drogas: cocaína, ecstasy, heroína e etanol, principalmente quanto aos seus efeitos agudos.
É um psicoestimulante (cujo efeito bioquímico induz à estimulação da mensagem na sinapse), atua principalmente nos neurônios pré-sinápticos que liberam dopamina, um neurotransmissor ligado ao prazer e à motivação para realizar atos importantes para a espécie, como comer e procriar. Atua ainda nos neurônios de serotonina e norepinefrina, sendo que esse último, devido ao seu amplo alcance no corpo via sistema nervoso autônomo, é responsável por grande parte dos efeitos colaterais do uso. A cocaína, ao chegar ao SN, se liga às proteínas recaptadoras desses neurotransmissores, impedindo que eles sejam reciclados dentro dos neurônios pré-sinápticos, amplificando muito suas mensagens e levando a sensações de euforia (dopamina), confiança (serotonina) e energia (norepinefrina).

Gráfico que mostra a concentração, no sangue, da cocaína sob diversas formas de administração, e, em conseqüência, as velocidades de absorção e metabolização dela. IV significa intravenoso, smoked é a droga fumada em cachimbo, nasal é o pó cheirado e oral é a droga mascada.
Foi popular nos anos 80 como a droga que trazia auto-conhecimento e chegou a ser recomendada por psicanalistas da época. Hoje, é consumida em “raves”, onde os jovens a ingerem em comprimidos de
O principal perigo dela é a hipertermia que pode provocar. Devido à vasoconstrição periférica, o calor que a pessoa absorve do ambiente, onde todos dançam próximos e há pouca circulação de ar, não consegue sair do corpo. Este tenta reparar isso suando para que a evaporação da água sobre a superfície da pele o resfrie, o que leva à desidratação. Ainda assim, é grande o perigo de o organismo chegar a mais de 40 graus Celsius de hipertermia e danificar o SN, podendo morrer ali mesmo. Se isso não acontecer, há ainda o risco de sofrer rabdomiólise, ou seja, as proteínas dos músculos se quebram e são drenadas pelo sangue, podendo entupir os glomérulos dos rins e provocar insuficiência renal aguda (IRA), com anúria, acidose sangüínea e todos os efeitos decorrentes disso.
Ainda há relatos (e experiências com animais) que parecem afirmar ser o ecstasy uma droga neurotóxica ao uso prolongado devido a lesões celulares irreversíveis provocadas pelas altas concentrações de serotonina no cérebro. Com a morte neuronal, sérias psicoses podem acometer o indivíduo, como a síndrome do pânico.
É uma droga depressora, ou seja, inibe a continuação das mensagens no SN. Existem neurotransmissores especializados em descontinuar mensagens, e eles servem para que elas não tenham uma dimensão maior do que a real, adequada para a situação. Dois exemplos desses neurotransmissores são o GABA (ácido gama-aminobutírico), um dos principais inibidores do SNC, e a endorfina, capaz de inibir, entre outros neurônios, os que lançam nas sinapses a substância P (no SNP, responsável pela sensação de dor), os que lançam o próprio GABA e os que lançam dopamina.
A heroína é um opiáceo (obs.: opiáceos são substâncias derivadas do ópio da papoula, potentes analgésicos, e opióides são substâncias sintéticas – à exceção das endorfinas, encefalinas e dinorfinas, opióides endógenos – que simulam os efeitos dos opiáceos por terem estruturas muito similares às suas; vários medicamentos são opióides) que pode ser injetado de forma intravenosa, fumado ou cheirado. Uma vez dentro do SNC (ultrapassa a barreira hemato-encefálica facilmente , bem como a barreira placentária, por ser muito solúvel em lipídeos), transforma-se em morfina, que é capaz de se ligar aos receptores de endorfina e inibir mensagens, mas, ao contrário da endorfina, a morfina não é facilmente reciclada pelo corpo e se mantém deprimindo continuamente o SN. Ela é capaz de deprimir os neurônios que passam informações de dor (substância P) e os outros neurônios inibitórios (GABA), mas não os do prazer (dopamina). Sem o GABA para manter as concentrações de dopamina aceitáveis, os níveis dessa no cérebro aumentam muito e daí vem a sensação de prazer. No entanto, ainda que com doses pequenas, já se percebe um dos efeitos mais característicos do uso de heroína: a depressão dos neurônios que controlam a respiração, principalmente os que checam o nível sangüíneo de bicarbonato, e não só o ato de respirar se torna mais difícil como o usuário não dá pela sua falta. Com uma overdose (freqüentemente alcançada quando o usuário se administra uma dose inesperadamente mais pura, logo, mais concentrada), ele pode morrer em minutos por parada respiratória e hipóxia. Devemos lembrar ainda que é uma droga com grande chance de provocar malformações no feto de uma grávida viciada.
Gráfico que mostra a interação do usuário com a droga, não em concentração sangüínea, mas, qualitativamente, em estado psicológico ("depressivo", "normal" e "eufórico"). Observe como a heroína provoca estados alternados e como os usuários tendem a usar mais droga para voltar ao estado eufórico (setas pretas) e como a metadona faz efeito mesmo com longo intervalo entre as doses.
A técnica da desintoxicação é muito usada para combater o vício. Trata-se de substituir a heroína por um opióide de ação longa ou duradoura, como a metadona, capaz de satisfazer a fissura e cujo período de síndrome de abstinência é maior, porém mais suave. Opióides de ação longa normalmente são usados como analgésicos de doenças crônicas enquanto opióides de ação curta, cujos efeitos são sentidos mais rapidamente, são usados em situações pontuais de grande dor, como períodos de pós-operatório. É extremamente baixa a ocorrência de vício entre pessoas que tomam opióides sob prescrição médica, mas não é tão incomum que médicos e outros profissionais da saúde que não passam por supervisão constante se viciem em remédios com tais substâncias.
Etanol
O etanol, ou simplesmente álcool como é chamado, tem basicamente dois mecanismos para exercer sua atividade depressora: ele se mistura às membranas neuronais, por ser parcialmente polar, e com isso dificulta a passagem do impulso elétrico por bombeamento de íons (também atravessa fácil a barreira hemato-encefálica e está relacionado à incidência de bebês nascidos com retardo mental); e se liga aos receptores GABAérgicos em um sítio periférico, mudando a estrutura do receptor e aumentando a sua afinidade pelo GABA, que se mantém ligado por mais tempo, permite a passagem de mais íons cloreto e despolariza o neurônio. Com isso, sua atividade inibitória fica superestimulada e o SN fica deprimido. O etanol ainda reduz o efeito excitatório do glutamato nos receptores NMDA (potencializa o processo depressor) e aumenta a liberação de dopamina de uma forma ainda pouco conhecida (induz ao prazer). Os efeitos contrários, esperados na síndrome de abstinência, explicariam a irritabilidade, a excitabilidade e os tremores característicos desse período.
Em overdose, o álcool provoca uma série de problemas. Além de aumentar muito as concentrações do seu metabólito tóxico, o acetaldeído, induz à hipoglicemia se largamente ingerido sem alimentação que o acompanhe, pois mantém atuando na sua própria via o NAD+ hepático, que não será usado tão cedo na via gluconeogênica (sua versão oxidada seria usada nas conversões de lactato a piruvato e malato a oxaloacetato); pode levar à descompensação de eletrólitos e ao choque devido ao volume de urina produzido (tanto para tentar desintoxicar o organismo quanto porque o hipotálamo foi também deprimido e não libera vasopressina no sangue); e, por fim, é capaz de deprimir o SN quase como um todo, levando ao coma e à parada respiratória, daí à morte.

Referências (as três primeiras têm simulações pra quem não entendeu muito bem, acessem!)
http://thebrain.mcgill.ca/flash/index_i.html (dentro de Pleasure and Pain>Pleasure and Drugs)
http://science.nhmccd.edu/biol/ap1int.htm (dentro de Drugs and Neurotransmitters)
http://www.jellinek.nl/brain/index.html
http://www.sbbq.org.br/revista/mtdidaticos.php (dentro de "Drogas e Bioquímica: Qual é o barato?")
http://www.drugabuse.gov/NIDAHome.html
http://www.uniad.org.br/bloguniad/DEFAULT.ASP?IDPOST=693
Goodman & Gilman, The Pharmacological Basis of Therapeutics, 11ª edição, 2006.
Um comentário:
tem uma figura que não aparece
e mais
cuidado com os links que não funcionam
abraços a todos
MHL
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