domingo, 29 de junho de 2008

Vacina contra cocaína

"Uma notícia promissora (e apenas isto, por enquanto) no combate aos problemas do consumo de cocaína veio do Instituto de Pesquisa Scripps, Califórnia, no final do ano passado. Utilizando ratos como cobaias, os cientistas deste Instituto desenvolveram uma substância que, ao ser injetada no sangue, estimula o organismo a produzir anticorpos para combater a droga. A nova vacina impede o estado de euforia do usuário de cocaína ao combater as moléculas da droga quando elas ainda estão trafegando na corrente sanguínea. Os testes demonstraram que os níveis de cocaína encontrados no cérebro dos ratos imunizados eram 77% mais baixos que nos animais que não receberam a vacina. “Os anticorpos agem como uma esponja, absorvendo a droga e impedindo que ela chegue ao cérebro”, afirma Kim Janda, um dos divulgadores da vacina em artigo da revista Nature. Como a sensação de euforia é menor, os cientistas acreditam que o usuário perderá o estímulo para continuar utilizando a droga. A este respeito, o psiquiatra brasileiro Jorge Figueiredo explica que “a importância da vacina está no fato de tornar cada vez mais distante a lembrança eufórica dos efeitos psicoativos”. A solução do consumo desta droga ainda está longe. Não se sabe ainda os efeitos concretos que ela teria no tratamento dos dependentes, já que foi testada apenas em ratos de laboratório. Mas uma vantagem destaca-a dos remédios hoje utilizados no tratamento de usuários da droga: ela não tem efeitos colaterais. “Não devemos esquecer que a dependência de drogas é uma doença mental, para a qual não existem curas rápidas”, alerta o psiquiatra David Self, professor da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Por enquanto é apenas uma esperança. O que já é uma grande coisa."

Extraído de:

http://www.caralimpa.com.br/conteudo.php?id_pagina=32

Drogas

O consumo de drogas é um problema grave da sociedade atual por vários motivos. Um deles diz respeito à saúde: elas são capazes de levar um indivíduo a condições extremas quanto ao que o seu corpo consegue suportar. Qualquer substância, quando em concentrações longe das adequadas à atividade normal do corpo humano, provoca disfunções, geralmente, devidamente alertadas pelo sistema nervoso para que remediemos isso. No entanto, algumas substâncias atuam exatamente no sistema nervoso, provocando sensações prazerosas que, longe de nos alertar do perigo, nos estimulam a querer repetir a dose. Essas substâncias são chamadas drogas psicotrópicas.

As drogas são perigosas por duas características: a tolerância e a dependência. Tolerância é a resposta do corpo ao consumo prolongado da mesma droga, tentando chegar a um novo estado estacionário, de forma que a droga, ao invés de gerar boas sensações, apenas passa a ser necessária para se ter as sensações cotidianas (explicações mais detalhadas adiante). Dependência é um conjunto de sintomas que indica que um indivíduo continua a usar a droga mesmo que ela lhe cause problemas. Graças à primeira, é necessária uma dose cada vez maior da droga para se chegar aos efeitos desejados; graças à segunda, a pessoa perde a noção (ou não lhe dá ouvidos) dos problemas que advirão desse uso.


Os prejuízos das drogas ao corpo humano podem ser crônicos (surgem depois de um tempo de uso moderado) ou agudos (surgem depois de uma overdose). Ambos são potencialmente letais (obs.: overdose não é necessariamente letal no conceito, é apenas uma dose considerada excessiva) e são provocados porque, devido à tolerância e à dependência, o organismo precisa lidar com concentrações da droga (e de seus metabólitos) cada vez mais altas, e até consegue se ajustar, mas imperfeitamente, e os tecidos passam a ficar avariados e provocar reações em cadeia em que um atrapalha o funcionamento e a manutenção do outro. É importante salientar que a tolerância a uma droga geralmente varia para os seus vários efeitos: enquanto o cérebro já se ajustou aos efeitos da droga e o prazer diminuiu, o fígado e os rins, por exemplo, mal conseguem lidar com a dose atual, quem dirá com uma mais alta.


Vamos estudar aqui quatro drogas: cocaína, ecstasy, heroína e etanol, principalmente quanto aos seus efeitos agudos.

Cocaína


É um psicoestimulante (cujo efeito bioquímico induz à estimulação da mensagem na sinapse), atua principalmente nos neurônios pré-sinápticos que liberam dopamina, um neurotransmissor ligado ao prazer e à motivação para realizar atos importantes para a espécie, como comer e procriar. Atua ainda nos neurônios de serotonina e norepinefrina, sendo que esse último, devido ao seu amplo alcance no corpo via sistema nervoso autônomo, é responsável por grande parte dos efeitos colaterais do uso. A cocaína, ao chegar ao SN, se liga às proteínas recaptadoras desses neurotransmissores, impedindo que eles sejam reciclados dentro dos neurônios pré-sinápticos, amplificando muito suas mensagens e levando a sensações de euforia (dopamina), confiança (serotonina) e energia (norepinefrina).





Como efeitos mais perigosos da cocaína, temos o descontrole do SNPA, com hipertensão arterial, vasoconstrição generalizada e hiperfuncionamento do coração (batidas mais fortes e mais rápidas). Com a vasoconstrição das artérias coronárias, o coração corre grande risco de sofrer de uma isquemia e passar por fibrose. O mesmo problema ocorre no cérebro, onde as estruturas são frágeis e podem sofrer lesões tanto por hipóxia seguida de necrose quanto por microhemorragias internas.
A cocaína ainda possui duas características dignas de nota. Primeira: provoca tolerância se consumida continuamente em um momento, mas, se consumida a intervalos razoáveis (cerca de uma vez por dia), provoca sensibilização em lugar de tolerância (mais receptores pós-sinápticos são produzidos) por razão ainda obscura. A necessidade da droga para manter esses altos níveis de prazer justifica a fissura extremamente agressiva típica dos usuários dessa droga. Segunda: induz principalmente a dependência psíquica e não física. O único efeito real da abstinência é a vontade incontrolável de consumir a droga. Mas isso não significa que ela é mais fraca que as outras, muito pelo contrário: é a terceira droga mais viciante segundo pesquisa feita entre 90 e 92 nos EUA, perdendo apenas para heroína e tabaco (Anthony et al., 1994). Disso decorre um fato importante: o risco de overdose é proporcional ao prazer obtido. É que o prazer é tão maior quanto mais rápido a droga for absorvida, o que muda conforme a forma de consumo, e, quanto mais rápido for absorvida, mais a sua concentração no corpo aumenta repentinamente. Dentre as formas de consumo, há a mascada (a droga é absorvida pela mucosa bucal), a cheirada (absorvida pela mucosa nasal), a injeção intravenosa e o fumo do crack (cocaína em pedra e mais impura). Os dois últimos são os mais perigosos, já que a droga vai praticamente instantaneamente para o sangue e daí para o cérebro. No fumo, a droga é absorvida nos alvéolos pulmonares, passa para as veias pulmonares, daí para o coração e para o cérebro em segundos, sem ter tido tempo para se espalhar pela circulação sistêmica. No entanto, quanto mais rápido a droga é absorvida, também mais rápido é metabolizada e é maior a chance de o usuário usá-la de novo na mesma hora para o prazer não acabar. Assim, devido à tolerância a curto prazo já mencionada, há a tendência de se usar quantidades cada vez maiores, levando à overdose.





Gráfico que mostra a concentração, no sangue, da cocaína sob diversas formas de administração, e, em conseqüência, as velocidades de absorção e metabolização dela. IV significa intravenoso, smoked é a droga fumada em cachimbo, nasal é o pó cheirado e oral é a droga mascada.


Ecstasy ou MDMA (3,4-metilenodioximetanfetamina)

Foi popular nos anos 80 como a droga que trazia auto-conhecimento e chegou a ser recomendada por psicanalistas da época. Hoje, é consumida em “raves”, onde os jovens a ingerem em comprimidos de 50 a 150 mg cada ou na forma de pó misturado a bebidas. Atua da mesma forma que a cocaína, mas principalmente sobre a serotonina, neurotransmissor ligado à saciedade, a sentimentos como o amor, às percepções sensoriais e ao controle da musculatura lisa dos vasos sangüíneos. Os que a tomam podem sentir desde leveza ou náuseas a, em maiores doses, alucinações com sonhos inebriantes ou pesadelos terríveis. Por esses efeitos, é considerada uma droga tanto estimulante quanto alucinógena.

O principal perigo dela é a hipertermia que pode provocar. Devido à vasoconstrição periférica, o calor que a pessoa absorve do ambiente, onde todos dançam próximos e há pouca circulação de ar, não consegue sair do corpo. Este tenta reparar isso suando para que a evaporação da água sobre a superfície da pele o resfrie, o que leva à desidratação. Ainda assim, é grande o perigo de o organismo chegar a mais de 40 graus Celsius de hipertermia e danificar o SN, podendo morrer ali mesmo. Se isso não acontecer, há ainda o risco de sofrer rabdomiólise, ou seja, as proteínas dos músculos se quebram e são drenadas pelo sangue, podendo entupir os glomérulos dos rins e provocar insuficiência renal aguda (IRA), com anúria, acidose sangüínea e todos os efeitos decorrentes disso.

Ainda há relatos (e experiências com animais) que parecem afirmar ser o ecstasy uma droga neurotóxica ao uso prolongado devido a lesões celulares irreversíveis provocadas pelas altas concentrações de serotonina no cérebro. Com a morte neuronal, sérias psicoses podem acometer o indivíduo, como a síndrome do pânico.

Heroína


É uma droga depressora, ou seja, inibe a continuação das mensagens no SN. Existem neurotransmissores especializados em descontinuar mensagens, e eles servem para que elas não tenham uma dimensão maior do que a real, adequada para a situação. Dois exemplos desses neurotransmissores são o GABA (ácido gama-aminobutírico), um dos principais inibidores do SNC, e a endorfina, capaz de inibir, entre outros neurônios, os que lançam nas sinapses a substância P (no SNP, responsável pela sensação de dor), os que lançam o próprio GABA e os que lançam dopamina.


A heroína é um opiáceo (obs.: opiáceos são substâncias derivadas do ópio da papoula, potentes analgésicos, e opióides são substâncias sintéticas – à exceção das endorfinas, encefalinas e dinorfinas, opióides endógenos – que simulam os efeitos dos opiáceos por terem estruturas muito similares às suas; vários medicamentos são opióides) que pode ser injetado de forma intravenosa, fumado ou cheirado. Uma vez dentro do SNC (ultrapassa a barreira hemato-encefálica facilmente , bem como a barreira placentária, por ser muito solúvel em lipídeos), transforma-se em morfina, que é capaz de se ligar aos receptores de endorfina e inibir mensagens, mas, ao contrário da endorfina, a morfina não é facilmente reciclada pelo corpo e se mantém deprimindo continuamente o SN. Ela é capaz de deprimir os neurônios que passam informações de dor (substância P) e os outros neurônios inibitórios (GABA), mas não os do prazer (dopamina). Sem o GABA para manter as concentrações de dopamina aceitáveis, os níveis dessa no cérebro aumentam muito e daí vem a sensação de prazer. No entanto, ainda que com doses pequenas, já se percebe um dos efeitos mais característicos do uso de heroína: a depressão dos neurônios que controlam a respiração, principalmente os que checam o nível sangüíneo de bicarbonato, e não só o ato de respirar se torna mais difícil como o usuário não dá pela sua falta. Com uma overdose (freqüentemente alcançada quando o usuário se administra uma dose inesperadamente mais pura, logo, mais concentrada), ele pode morrer em minutos por parada respiratória e hipóxia. Devemos lembrar ainda que é uma droga com grande chance de provocar malformações no feto de uma grávida viciada.



Gráfico que mostra a interação do usuário com a droga, não em concentração sangüínea, mas, qualitativamente, em estado psicológico ("depressivo", "normal" e "eufórico"). Observe como a heroína provoca estados alternados e como os usuários tendem a usar mais droga para voltar ao estado eufórico (setas pretas) e como a metadona faz efeito mesmo com longo intervalo entre as doses.

A técnica da desintoxicação é muito usada para combater o vício. Trata-se de substituir a heroína por um opióide de ação longa ou duradoura, como a metadona, capaz de satisfazer a fissura e cujo período de síndrome de abstinência é maior, porém mais suave. Opióides de ação longa normalmente são usados como analgésicos de doenças crônicas enquanto opióides de ação curta, cujos efeitos são sentidos mais rapidamente, são usados em situações pontuais de grande dor, como períodos de pós-operatório. É extremamente baixa a ocorrência de vício entre pessoas que tomam opióides sob prescrição médica, mas não é tão incomum que médicos e outros profissionais da saúde que não passam por supervisão constante se viciem em remédios com tais substâncias.

Etanol

O etanol, ou simplesmente álcool como é chamado, tem basicamente dois mecanismos para exercer sua atividade depressora: ele se mistura às membranas neuronais, por ser parcialmente polar, e com isso dificulta a passagem do impulso elétrico por bombeamento de íons (também atravessa fácil a barreira hemato-encefálica e está relacionado à incidência de bebês nascidos com retardo mental); e se liga aos receptores GABAérgicos em um sítio periférico, mudando a estrutura do receptor e aumentando a sua afinidade pelo GABA, que se mantém ligado por mais tempo, permite a passagem de mais íons cloreto e despolariza o neurônio. Com isso, sua atividade inibitória fica superestimulada e o SN fica deprimido. O etanol ainda reduz o efeito excitatório do glutamato nos receptores NMDA (potencializa o processo depressor) e aumenta a liberação de dopamina de uma forma ainda pouco conhecida (induz ao prazer). Os efeitos contrários, esperados na síndrome de abstinência, explicariam a irritabilidade, a excitabilidade e os tremores característicos desse período.


Em overdose, o álcool provoca uma série de problemas. Além de aumentar muito as concentrações do seu metabólito tóxico, o acetaldeído, induz à hipoglicemia se largamente ingerido sem alimentação que o acompanhe, pois mantém atuando na sua própria via o NAD+ hepático, que não será usado tão cedo na via gluconeogênica (sua versão oxidada seria usada nas conversões de lactato a piruvato e malato a oxaloacetato); pode levar à descompensação de eletrólitos e ao choque devido ao volume de urina produzido (tanto para tentar desintoxicar o organismo quanto porque o hipotálamo foi também deprimido e não libera vasopressina no sangue); e, por fim, é capaz de deprimir o SN quase como um todo, levando ao coma e à parada respiratória, daí à morte.


Referências (as três primeiras têm simulações pra quem não entendeu muito bem, acessem!)

http://thebrain.mcgill.ca/flash/index_i.html (dentro de Pleasure and Pain>Pleasure and Drugs)

http://science.nhmccd.edu/biol/ap1int.htm (dentro de Drugs and Neurotransmitters)

http://www.jellinek.nl/brain/index.html

http://www.sbbq.org.br/revista/mtdidaticos.php (dentro de "Drogas e Bioquímica: Qual é o barato?")

http://www.drugabuse.gov/NIDAHome.html

http://www.uniad.org.br/bloguniad/DEFAULT.ASP?IDPOST=693

Goodman & Gilman, The Pharmacological Basis of Therapeutics, 11ª edição, 2006.

sábado, 28 de junho de 2008

Treinamento físico ao extremo


Síndrome do Excesso de treinamento (overtraining)

Pessoas normalmente procuram praticar exercícios para ter seus desempenhos melhorados; contudo, a busca por esses objetivos por vezes esbarra em limites impostos pelo nosso corpo que devem ser respeitados. A prática de exercício em excesso sem os devidos cuidados (alimentação, descanso e orientação qualificada) acarreta em um quadro de estresse corporal que tem sido estudado pelos profissionais de educação física e medicina esportiva, tal quadro é conhecido como Síndrome do Excesso de treinamento (Overtraining). Tal síndrome não é exclusiva de atletas de alto rendimento, porém são estes que mais sofrem com esse tipo de problema, e por isso são o objeto de estudo para se compreender os mecanismos dessa síndrome.
A definição de Overtraining não varia entre os estudiosos, que o classifica como um distúrbio neuroendócrino provocado pela falta de compatibilidade entre a prática esportiva e os processos de descanso, acarretando em problemas metabólicos. Tais problemas não comprometem apenas a fisiologia do atleta, pois alteram também os aspectos emocionais deste.
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A Síndrome de excesso de treinamento possui diversos sintomas, portanto nem sempre é possível diagnosticar um atleta com muita certeza. No entanto, surgiram a partir de pesquisadores hipóteses que tentam relacionar o excesso de exercício com determinados fatores que fazem parte do quadro de sintomas da síndrome. O quadro de sintomas abrange, dentre outros: alterações metabólicas, redução do desempenho atlético e da resposta ao treinamento em indivíduos saudáveis, incidência de contusões e infecções virais e bacterianas por queda de resistência imunológica, alterações no estado de humor, fadiga constante, dentre outros.
Para melhor entendimento desta síndrome, é necessário conhecer o tipo de treinamento a que os atletas estão submetidos. A maioria dos atletas de alto rendimento segue uma rotina de treino determinada pelo seu responsável, normalmente essa rotina é adequada ao atleta e direcionada para seu objetivo principal. Os períodos específicos de treinamento seguem, em sua maioria, a teoria da “super compensação”; tal teoria defende que o atleta ao ser submetido a um esforço que supere o seu limite, tende a se recuperar e atingir condições superiores ao patamar anterior, promovendo assim uma evolução no seu condicionamento.



Contudo, nem sempre essa recuperação é adequada, o que leva o atleta a um quadro de deterioração metabólica que prejudica o seu rendimento e que pode durar de meses a anos. Quando o problema é rapidamente superado, ele é denominado “Overreaching”, se o problema persistir e agravar passa a ser denominado “Overtraining”; logo, o primeiro pode ser indício de um possível quadro de “overtraining”.
O constante aparecimento desta síndrome levou pesquisadores a estudá-la mais seriamente, a fim de determinar os seus sintomas e causas, podendo assim diagnosticar o quadro precocemente e evitar as conseqüências duradouras deste problema. Com os estudos, foram surgindo hipóteses que tentam explicar os mecanismos metabólicos envolvidos com a manifestação da síndrome.
As hipóteses a seguir foram extraídas do artigo de revisão: Aspectos neuroendócrinos e nutricionais em atletas com overtraining( Marcelo Macedo Rogero; Renata Rebello Mendes; Julio Tirapegui, USP-SP).

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-27302005000300006&lng=en&nrm=iso



Hipótese de Lesão, inflamação e citocinas:

Essa hipótese propõe que pequenos traumas musculares e/ou esqueléticos e/ou articulares possam desencadear a síndrome de overtraining.
Microtraumas teciduais adaptativos (MTA) ocorrem naturalmente durante a execução de determinados tipos de exercícios físicos, e que a sua recuperação depende apenas de um programa de treinamento adequado, caracterizado por períodos de repouso suficientes. Os MTA resultam em uma resposta inflamatória moderada, que tem como finalidade o processo de "cicatrização", com conseqüente adaptação muscular e/ou óssea e/ou do tecido conectivo.
Na maioria dos casos, essas respostas inflamatórias locais resultam em processos de recuperação dos traumas, o que tem sido considerado um processo de "adaptação do atleta". Porém, acredita-se que essa recuperação não seja alcançada por atletas que estejam realizando treinamentos de alto volume e/ou de alta intensidade, e aquela pequena inflamação aguda e local possa evoluir para um quadro de inflamação crônica e acarretar, posteriormente, uma inflamação sistêmica. De acordo com Rogero e Tirapegui, parte desta inflamação sistêmica envolve ativação de monócitos circulantes, os quais podem sintetizar grandes quantidades de citocinas pró-inflamatórias [interleucina (IL)-1, IL-6 e TNF-a].



Citocinas e Eixos Hipotálamo-Hipófise-Adrenal e Hipotálamo-Hipófise-Gonadal ( hipótese extraída integralmente )
Durante processos patológicos ou lesões, ou outras formas de estresse - como o psicológico -, a comunicação entre o sistema nervoso central e o sistema imune é crucial. Desse modo, é fundamental ressaltar o papel do hipotálamo, que representa um relevante centro de coordenação das funções neuroendócrinas, controlando as concentrações sangüíneas de hormônios do estresse (cortisol) e de hormônios gonadais, como testosterona e estradiol (15).
O excesso de treinamento físico, tanto como o estresse psicológico, podem promover uma alteração do balanço hormonal, sendo que este fato tem sido associado ao overtraining. Ao mesmo tempo, verifica-se que a elevada liberação de citocinas pró-inflamatórias desencadeada pelo processo de inflamação sistêmica - decorrente do excesso de treinamento - age no sistema nervoso central. Os receptores para as citocinas IL-1 e IL-6 no cérebro são abundantes na região hipotalâmica, e a interação dessas citocinas com receptores específicos em núcleos paraventriculares hipotalâmicos resulta na liberação do hormônio liberador de corticotrofina (CRH) e, conseqüentemente, do ACTH e do cortisol. Aliada à ação das citocinas no hipotálamo, a IL-6 pode controlar a liberação de hormônios esteróides pela ação direta sobre as células adrenais e regular a síntese de mineralocorticóides, glicocorticóides e andrógenos, sendo esse controle dependente da concentração e do tempo de exposição à IL-6. Sendo assim, a inflamação sistêmica e a elevação da concentração sangüínea de citocinas podem ser responsáveis pelo aumento da concentração sérica de cortisol observada em indivíduos com overtraining (12-14). Além disso, o aumento da concentração das citocinas IL-1b e IL-6 pode promover a ativação de diversos núcleos hipotalâmicos, os quais podem responder por muitas das alterações comportamentais relacionadas a doenças, tais como redução do apetite, depressão, comumente observados entre atletas com overtraining (13,16).
As citocinas também ativam o sistema nervoso simpático, enquanto suprimem a atividade do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas, sendo, desse modo, responsáveis pelas alterações observadas nas concentrações sangüíneas de catecolaminas e hormônios gonadais, as quais estão presentes em atletas em estado de overtraining (1,15,17).
Em relação à supressão do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas induzida por citocinas pró-inflamatórias (IL-1a, TNF-a), destaca-se o papel da IL-1 sobre a secreção de gonadotrofinas. Três potenciais locais de ação são considerados: o sistema nervoso central, a hipófise e as gônadas. No sistema nervoso central, a administração de IL-1a dentro do ventrículo lateral de animais castrados provocou a inibição (dose-dependente) da secreção
do hormônio luteinizante (LH) (18). Além disso, Rivier e Vale (18) verificaram que a administração intraperitoneal de IL-1a em animais tratados com gonadotrofinas resultou em inibição da secreção de estradiol e progesterona, enquanto não houve efeito da administração intracerebroventricular de IL-1a sobre a secreção de LH pela hipófise. Desse modo, observa-se que a IL-1a atua tanto no sistema nervoso central e nas gônadas - mas não na hipófise - inibindo as funções reprodutivas. Cabe ressaltar, também, que a citocina pró-inflamatória TNF-a inibe a liberação de LH induzida pelo hormônio liberador do LH (LHRH) a partir da hipófise em um modelo dose-dependente, porém não influencia a liberação basal de LH (19).
As citocinas pró-inflamatórias exercem, também, sua ação por meio da regulação da função hepática, promovendo a manutenção da glicemia por meio da estimulação da neoglicogênese e favorecendo a síntese de proteínas de fase aguda relacionadas ao processo de inflamação, concomitante ao estado hipercatabólico. Além disso, o prejuízo da imunocompetência observado no estado de overtraining é explicado, pela presente hipótese, devido à presença de fatores antiinflamatórios que sucedem a resposta pró-inflamatória no decorrer da resposta ao trauma tecidual (1). Dentre os fatores anti-inflamatórios destacam-se as citocinas anti-inflamatórias, que incluem IL-4, IL-10, IL-13 e o antagonista do receptor de IL-1 (IL-1ra); e os hormônios, especificamente o cortisol, que apresenta significativa ação anti-inflamatória. Apesar desses efeitos anti-inflamatórios serem necessários para contrapor-se àqueles pró-inflamatórios, verifica-se que esse processo resulta em imunossupressão em indivíduos com overtraining, ou seja, a imunossupressão pode refletir a tentativa do organismo de conter a inflamação induzida pelo exercício físico por meio da síntese de moléculas endógenas anti-inflamatórias (12-15).
Síndrome de Overtraining e Depleção de Glicogênio
É conhecido o fato de que a diminuição dos estoques de carboidrato consiste em um significativo fator desencadeante da fadiga periférica, o que reforça a relevância desse nutriente no desempenho de um atleta. Estudos demonstram que diversos atletas apresentam diminuição significativa do conteúdo de glicogênio muscular em importantes períodos da temporada de treinamento, onde ocorrem elevações significativas do volume de esforço. A redução do conteúdo de glicogênio muscular, e conseqüente depleção dos estoques de energia, pode estimular a oxidação intramuscular de aminoácidos de cadeia ramificada (AACR), ou seja, leucina, isoleucina e valina. Desta forma, ocorreria uma diminuição da concentração plasmática desses aminoácidos, o que facilitaria a captação hipotalâmica de triptofano livre e, conseqüentemente, promoveria uma maior síntese de serotonina (ou 5-hidroxitriptamina) a partir do triptofano, desencadeando a fadiga central e, possivelmente, a síndrome de overtraining. Essa hipótese é criticada, já que pode ocorrer mesmo em indivíduos que apresentam concentrações normais de glicogênio muscular.


Síndrome de Overtraining e Glutamina
A reduzida concentração plasmática de glutamina observada em atividades físicas prolongadas seria responsável pela supressão da resposta imune associada ao aumento da taxa de infecções observadas na síndrome de overtraining. Já que em condições normais a glutamina seria distribuída principalmente para as células do sistema imune, rins e fígado. Contudo, durante atividades físicas intensas e prolongadas, a rota metabólica da glutamina parece sofrer alterações, com um maior fluxo deste aminoácido para o fígado e para os rins; nestes tecidos, a glutamina desempenha funções relevantes para a continuidade do exercício, tais como síntese de glicose através da neoglicogênese (fígado) e regulação da acidose instalada (rins). Sendo assim, a disponibilidade de glutamina para as células do sistema imunológico apresenta-se
reduzida, o que pode contribuir para o aumento da susceptibilidade a infecções do trato respiratório superior em atletas após o exercício intenso e prolongado, ou durante o período de treinamento exaustivo. Foi observado que os atletas que demonstraram sinais e sintomas de fadiga crônica durante a fase de treinamento também apresentaram concentração de glutamina plasmática abaixo dos valores considerados normais (500 a 750µmol/l). Após as Olimpíadas, durante um período de treinamento leve, a glutaminemia dos atletas com sintomas de fadiga crônica e infecções ainda permanecia reduzida. Este fato demonstra que um pequeno período de ";descanso"; não foi capaz de recuperar esses atletas, o que afasta a hipótese de overreaching e reforça a hipótese de overtraining entre esses atletas com baixa glutaminemia.


Síndrome de Overtraining e Hipótese da Fadiga Central
O aumento da captação de triptofano pelo hipotálamo resultaria em maior síntese de serotonina, e esta elevação da concentração hipotalâmica de serotonina seria um fator capaz de desencadear a fadiga. A fadiga desencadeada pelo acúmulo de serotonina é caracterizada, principalmente, pela sensação de desmotivação, e tem sido denominada fadiga central. Esse mecanismo tem sido justificado por dois princípios : o primeiro, já citado, seria o aumento da oxidação de AACR, o que possibilitaria maior captação hipotalâmica de triptofano livre; o segundo mecanismo seria o gradual aumento da concentração de ácidos graxos no plasma durante a atividade física prolongada, os
quais competem com o triptofano pela ligação à albumina. Desse modo, observa-se uma maior utilização da albumina por parte dos ácidos graxos, o que resulta em elevação da concentração de triptofano livre.


EXERCÍCIO EXAUSTIVO E A TRÍADE DA MULHER ATLETA ( extraído integralmente )
O sistema reprodutivo feminino é altamente sensível ao estresse fisiológico, e anormalidades reprodutivas incluindo atraso da menarca, amenorréia primária e secundária e oligomenorréia ocorrem entre 6-79% das mulheres engajadas em atividades atléticas. Apesar de a incidência de desordens menstruais ser elevada em corredoras e bailarinas, também são suscetíveis mulheres atletas envolvidas com remo, ciclismo, voleibol, tênis de campo, esgrima, esqui, natação e ginástica. Cabe ressaltar que a disfunção menstrual é mais comumente observada em esportes onde a perda de gordura corporal é combinada com exercícios exaustivos, principalmente exercícios de endurance (41,42).
As anormalidades reprodutivas observadas em atletas do sexo feminino geralmente originam-se por meio da disfunção hipotalâmica; todavia, os mecanismos específicos que desencadeiam a disfunção reprodutiva podem variar de acordo com o tipo de esporte. O perfil hormonal da mulher engajada em esportes que enfatiza a manutenção de um baixo peso corporal, como balé, corrida de longa distância e ginástica, é caracterizado pelo hipoestrogenismo decorrente da alteração do eixo hipotálamo-hipófise-ovário. Especificamente, a supressão da liberação pulsátil hipotalâmica do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), a qual ocorre a cada 60-90 minutos, limita a secreção hipofisária do LH e, em uma menor extensão, do hormônio folículo estimulante (FSH), o qual, por sua vez, limita a estimulação ovariana e a síntese de estradiol. Essas alterações estão relacionadas à supressão leve ou intermitente dos ciclos menstruais nessas atletas. Além disso, concentrações de LH muito baixas provocam o atraso da menarca ou a ocorrência de amenorréia primária ou secundária.
Hipóteses relacionadas à disfunção reprodutiva em atletas do sexo feminino relacionam a composição corporal e os efeitos do exercício exaustivo. Contudo, em mulheres que apresentam gasto energético superior à ingestão energética pela dieta, sugere-se que esse déficit energético seja o fator primário que afeta a pulsatilidade do GnRH. Cabe destacar que o exercício associado com a restrição calórica promove a supressão do LH, enquanto o exercício isoladamente não apresenta efeito sobre a pulsatilidade do LH.
A supressão da função reprodutiva em mulheres engajadas em esportes que enfatizem o baixo peso corporal pode estar relacionada a uma adaptação neuroendócrina frente ao déficit calórico. O hormônio leptina, secretado pelos adipócitos, parece ser um regulador da taxa metabólica e um significativo mediador da função reprodutiva. A concentração de leptina varia em resposta aos estoques de gordura e à disponibilidade de energia, sendo que o ritmo diurno da concentração de leptina é suprimido em resposta à baixa ingestão energética (43,45). Além disso, alterações no eixo hipotálamo-gonadal e em outros eixos endócrinos decorrentes do déficit energético estão associadas com baixas concentrações de leptina e podem resultar em amenorréia hipotalâmica (46). Welt e cols. (46) verificaram que a administração de leptina recombinante exógena em mulheres com amenorréia hipotalâmica melhorou tanto os valores de hormônios relacionados à tireóide e aos eixos reprodutivo e de crescimento quanto os marcadores de formação óssea, sugerindo que a leptina é necessária para a função normal reprodutiva e neuroendócrina. Além disso, receptores de leptina têm sido verificados em neurônios hipotalâmicos envolvidos na pulsatilidade do GnRH (43). Portanto, a leptina pode representar um fator crítico envolvido em sinalizar a baixa disponibilidade de energia para o eixo reprodutivo (46).
Em mulheres atletas, observa-se a ocorrência de alteração de comportamento alimentar (bulimia, anorexia) e de balanço energético negativo, principalmente em esportes que exijam a manutenção de baixo peso corporal, conforme citado anteriormente, como por exemplo maratonistas e bailarinas. O perfil hormonal metabólico e reprodutivo dessas atletas é similar àquele de mulheres amenorréicas com desordens alimentares, o que ressalta a importância da nutrição associada às adaptações metabólicas como fatores causais na disfunção menstrual de atletas (43-45).
A disfunção reprodutiva resultante a partir da supressão do GnRH observada em mulheres atletas também apresenta uma relevante influência sobre o esqueleto. A perda de densidade mineral óssea é diretamente relacionada à duração da amenorréia, e evidências experimentais indicam que essa perda é irreversível. Portanto, é fundamental restaurar a menstruação de atletas com amenorréia tão breve quanto possível para minimizar a perda e as complicações ósseas resultantes a partir da osteopenia e osteoporose (43,44).
Em resumo, verifica-se que o conjunto de sintomas citados acima compõe uma síndrome conhecida na medicina esportiva como tríade da mulher atleta (amenorréia, desordens alimentares e osteoporose), que representa um exemplo de overtraining. O tratamento indicado é a diminuição da intensidade do exercício e a ingestão de uma dieta balanceada e diversificada. Cabe ressaltar que recentes estudos têm sido realizados investigando o possível papel da reposição hormonal como forma de tratamento.

Bioquímica da Desnutrição

Atualmente, a desnutrição e a fome acometem 820 milhões de pessoas no mundo, entre elas 146 milhões de crianças, e são responsáveis por 24 mil mortes diárias. Têm-se aí um enorme problema que envolve múltiplos fatores econômicos e sociais. O objetivo aqui, é fazer uma análise mais pontual a cerca da resposta corporal diante da falta de nutrientes e de suas conseqüências por causas diversas.

Desnutrição Intra-uterina

O desenvolvimento intra-uterino é um período de atividade metabólica extremamente alta e acelerada, de formação de sistemas e síntese de substâncias fundamentais. A nutrição do feto depende exclusivamente da nutrição materna e por isso, problemas na alimentação da mãe afetam diretamente o crescimento do mesmo. A escassez de alimentos durante essa fase funciona como um sinalizador para o feto, alertando-o para uma vida futura de falta de nutrientes. “Assim, o feto desenvolve um metabolismo econômico, mediado por insulina, visando a uma melhor adaptação num ambiente de estresse nutricional.” As conseqüências porém não se restringem somente à gestação. Neste caso, se o déficit de nutrientes não ocorrer na vida adulta, essa adaptação adquirida causará uma maior predisposição para o desenvolvimento de diabetes. Associados a isso estão ainda outros problemas.



Pesquisadores da Organização Holandesa de Cuidado Mental e da Erasmus University Rotterdam estudaram homens e mulheres nascidos em Rotterdam durante 1944 e 1947, período conhecido como “Inverno da Fome”. Aqueles cujas mães sofreram com a falta de alimentação durante o inicio da gestação, são significadamente mais susceptíveis á desordens crônicas, como doenças do coração, psicológicas, como esquizofrenia e depressão, relacionadas a diferentes vícios. Quanto a isso, um estudo recente revelou que caso o cérebro não consiga se desenvolver normalmente no útero, anormalidades neuro-desenvolvimentais podem ocorrer aumentando o risco de vícios na vida adulta. Ernest Franzek, o líder da pesquisa, diz: “a escassez de alimentos após os três primeiros meses de gestação não significou um aumento nas chances de desenvolvimento de vícios, o que mostra que o primeiro trimestre é crucial no desenvolvimento no sistema de recompensamento no cérebro humano, que está envolvido no comportamento do vício” e que as descobertas “apontam a influencia da desnutrição materna na saúde mental de sua prole adulta”. De forma geral a desnutrição materna leva ao nascimento de recém-nascidos pequenos para a idade gestacional, além dos problemas de baixo peso, imaturidade de órgãos e aparelhos, problemas metabólicos e maior risco de distúrbios no desenvolvimento neuropsicomotor.

O Corpo e a Fome


A greve de fome é uma estratégia utilizada como pressão política por revolucionários e protestantes para chamar a atenção para sua causa. Seus efeitos morais e resultados práticos geram polêmica e são amplamente discutidos pela população e pela mídia e até marcaram períodos expressivos da história mundial. Alguns casos se destacam, como o da ativista indígena Patrícia Troncoso, que sobreviveu a um jejum de 111 dias para chamar a atenção do governo chileno (e do mundo) para o sofrimento do povo Mapuche ou Terence MacSwiney, que morreu apo 74 dias de jejum. Reservadas as particularidades de seus metabolismo, os organismos de Patrícia e Terence e de milhões de outros grevistas reagiram basicamente da mesma forma à privação de alimento.


A glucose é a fonte primária de energia para o corpo. Porém, sua reserva como glicogênio muscular pode ser esgotada em até uma hora de exercícios vigorosos e o glicogênio hepático se esgota após 12 a 24 horas de jejum. O objetivo do corpo é manter a glicemia sanguínea sempre em níveis relativamente constantes para suprir tecidos que dependem exclusivamente dessa fonte de energia, como o cérebro e as células sangüíneas.

Cerca de quatro horas após uma refeição, período durante o qual a queda da glucose sérica causa a diminuição da relação insulina/glucagon e a conseqüente quebra do glicogênio hepático inicia-se a via de gliconeogênese e a captação de glucose pelos músculos e células adiposas é diminuída, para a manutenção dos níveis plasmáticos de glucose (alimentada pela mobilização de glicogênio hepático e utilização de ácidos graxos pelo músculo e pelo fígado) Durante o jejum noturno (curto) a glicemia é mantida ¾ por glicogenólise e ¼ por gluconeogênese, quadro resultante dos efeitos do glucagon. As concentrações altas de acetil-coA e citrato mantém a glicólise inibida.




Observa-se também diminuição da síntese protéica e lipogênese, porém não há ainda proteólise ou lipólise significativa.

Nas primeiras 24 de jejum não-comçlicado é possível observar as seguintes adaptações do organismo:


  • Redução da secreção e atividade de insulina

  • Aumento da atividade de glucagon

  • Redução do glicogênio hepático e muscular

  • Menor produção de glicose

  • Diminuição da tiroxina e do consumo de O2

  • Redução da atividade simpática

  • Diminuição do metabolismo basal

Nesse tempo, a média de 450-500 gramas de glicogênio em um adulto é oxidada e então há a necessidade da mudança do principal substrato energético. Nesse período, o fígado é o responsável por suprir o organismo de glucose, uma vez que o músculo não possui glicose-6-fosfatase, e por tanto é incapaz de liberar glucose diretamente no sangue (ainda assim, a glicose-6-fosfato muscular pode ser oxidada até lactado, que é exportado para o fígado para entrar na gluconeogênese hepática.). Outras concentrações de glucose obtidas a partir de gluconeogênese advém da lise de proteínas (aminoácidos) e glicerol, para atender ás necessidades energéticas do SNC, hemácias, medula renal e leucócitos.




Fluxo de nutrientes após jejum de 18-24 horas


O balanço nitrogenado (BN) mede a diferença entre a quantidade de nitrogênio ingerido na forma de proteínas e a quantidade excretada na urina. Em condições normais em um adulto o BN é zero, já que não há armazenamento de nitrogênio. O seu excesso é excretado pela urina. Em casos de jejum o BN é negativo devido ao uso de parte das proteínas como fonte energética. Para entender o metabolismo protéico durante inanição, deve-se analisar também a composição da urina.




Excreção urinária de compostos nitrogenados em condições normais e no jejum prolongado (inanição).




O aumento da concentração amônia na urina reflete a adaptação do corpo para reduzir a perda muscular, bem como a diminuição da excreção total de compostos na urina. O consumo de cerca de 70 gramas de proteínas por dia indica uma perda muscular de 350 gramas aproximadamente, de um total de seis quilos É importante ressaltar que apenas 1/3 das proteínas corporais podem ser empregadas para produzir energia sem comprometer funções vitais.


No jejum prolongado o organismo adapta-se para a conservação de energia e nutrientes. Como reflexo disso, ocorre a diminuição do gasto energético em decorrência da ausência do efeito térmico dos alimentos e da diminuição dos efeitos de T3 e da massa corporal metabolicamente ativa. Também é verificado redução da intensidade de proteólise, que inicialmente alimentou a produção de glicose para o SNC. O aumento da oxidação de ácidos graxos (fonte de energia para a gliconeogênese) eleva as concentrações de acetil-coA para além da capacidade de consumo do ciclo de Krebs e aumenta a síntese de corpos cetônicos. Com o tempo, o tecido nervoso se torna mais permeável aos corpos cetônicos e cai a necessidade de glucose para oxidação.


Isso reduz a necessidade de gliconeogênese a partir de esqueletos carbônicos dos aminoácidos, economizando proteínas essenciais. Com 24 horas, apenas 10% das necessidades energéticas cerebrais é suprida por corpos cetônicos. Após quatro dias de jejum, 60% do combustível do cérebro é constituído por corpos cetônicos. A demanda por glucose nesse tecido, porém não se acaba. O metabolismo de corpos cetônicos ocorre apenas em mitocôndrias, estruturas grandes demais para transitarem até as terminações sinápticas dos axônios. Nos músculos, após três semanas quase não há mais uso de corpos cetônicos, a energia é praticamente toda obtida pela oxidação de ácidos graxos. O tempo de resistência depende da quantidade de tecido adiposo e muscular. Uma vez terminadas as reserva de triglicerídeos, o organismo volta a usar proteínas como fonte de energia.

O quadro de hipoglicemia promove a seguinte resposta hormonal, que medeia todo o metabolismo nessas condições: ativa os neurônios hipotalâmicos, que sintetizam e liberam mediadores químicos (hormônios) na corrente sanguínea, ao invés que realizar sinapse. Estimulado então, a hipófise libera o hormônio adenocorticotrófico (ACTH) e hormônio do crescimento. Tais hormônios levam á liberação de cortisol pelas glândulas supra-renais. Este estimula a gliconeogênese e inibe o uso de glicose pelo tecido adiposo e pelos músculos.


Manifestações Fisiológicas


É interessante notar as alterações e conseqüências fisiológicas causadas pela não ingestão de nutrientes. Alguns sintomas gerais além dos evidentes baixos índices de gordura e tecido muscular são característicos dos indivíduos subnutridos e podem ser visualizados no site:


Cetoacidose:


Os corpos cetônicos derivados da degradação de ácidos graxos durante o jejum são moléculas ácidas que em concentrações elevadas podem alterar significadamente o pH sanguíneo. Na tentativa de livrar o sangue do excesso de ácido o organismo força uma respiração mais profunda e rápida (Respiração de Kussmaul: amplas e rápidas inspirações interrompidas por curtos períodos de apnéia, após as quais ocorrem expirações profundas e ruidosas, sucedidas por pequenas pausas de apnéia), reduzindo a quantidade de dióxido de carbono no sangue. Em casos mais extremos, os rins tentam auxiliar eliminando mais ácido na urina. À medida que a acidose piora, os sintomas são fraqueza, sonolência, confusão mental e náusea progressiva, podendo finalmente causar queda da pressão arterial, choque, coma e morte.

Hiperamonenia:

Com o metabolismo contante de proteínas, a capacidade do fígado de transformar amônia em uréia e do rim de eliminar a última pode não ser suficiente. O acúmulo de amônia no sangue e a consequente intoxicação por essa substancia desencadeia diversas reações no organismo, uma alteração no equilíbrio da reação da
glutamato desidrogenase, depleção de alfa cetoglutarato e redução do ciclo de Krebs.
Para proteger o organismo da toxicidade da amônia, numa explicação superficial, α-cetoglutarato deve ser reduzido a glutamato pela glutamato desidrogenase e a amônia é combinada com glutamato para a síntese de glutamina pela glutamina sintetase. A glutamina é forma não tóxica de tranportar amônia, além de ser a fonte de grupos amino em varias reações de biosíntese. No caso dos músculos, o papel de transportador da amônia para o fígado é feito pela alanina.


Ambas as enzimas então presentes em altas concentrações no cérebro, e por tanto esse tecido se torna vulnerável a qualquer alteração que ocorra nesse ciclo. Altas taxas de amônia levam a um aumento na concentração de glutamina nos astrócitos cerebrais podendo causar a entrado maciça de agua dentro dessas células, caracterizando edema cerevral e aumento da pressão craniana. Os astrócitos ainda sofrem mudaças estruturais. O mRNA responsável pela tradução da proteína constituinte dos filamentos intermediários do citoesqueleto dos astrócitos, e a própria proteínas são gerados em menos quantidade nessas condições, facilitando a destruição celular.


Taxas elevadas de amônia levam a uma maior produção de lactato pelo SNC e maior atividade da fosfofrutoquinase 1 e dos transportadores de glucose, o que revela um aumento na via glicolítica. Apesar disso, quanto maior a concentração de amônia, menos é a capacidade dos neurônios de gerar energia. Isso se explica pelo fato de que o aumento das taxas de lactado não permite que o piruvato disponíveis se integre ao ciclo de Krebs. Além disso receptores ativados por glutamato que funcionam como canais de íons são hiperestimulados, causando um desequilíbrio eletrolítico que exige uma ação maior da bomba de sódio e potássio, levando a um maior gasto energético.


Nos neurônios, ocorre a síntese de glutamato nos terminais pré-sinápticos e a sua liberação na fenda sinaptica para a transmissão do impulso nervoso. No neurônio pós-sináptico o glutamano é captado e tranformado em glutamina. Esta é liberada para o espaço intertecidual e recaptada pelos neurônios pré-sinápticos. Os transportadores responsáveis por retirar o glutamato da fenda sináptica tem atividade diminuida no quadro de hiperamonemia. A manutenção do glutamato durante maior tempo na fenda sináptica aumentando a possibilidade de exitotocicidade (FELIPO e BUTTERWORTH, 2002b).


A amônia irá afetar significadamente o controle cerebral por meio dos neurotransmissores. O GABA por exemplo, é um importante neurotransmissor inibitório. Em condições de alta concentração de amônia, sua afinidade por seu receptor neuronal aumenta, causando um acúmulo de íon cálcio nos neurônios, que pode induzir a morte celular.


De maneira geral “a hiperamonemia clínica causa efeitos como alterações no ciclo sono/vigília, coordenação neuromuscular e cognição”, e pode estar relacionada com o mecanismo de fadiga central.

Desequilíbrio eletrolítico:

O desequilíbrio eletrolítico é um grave favor enfrentado por pessoas desidratadas e em jejuns prolongados. Concentrações corretas de minerais em cada compartimento são essenciais para a coordenação das atividades celulares. Qualquer fator que interfira nesse delicado equilíbrio em qualquer um de suas etapas, prejudica toda a cadeia de reações.


Entre as conseqüências do desequilibro eletrolítico estão: contrações, fraqueza e espasmos musculares, câimbras, confusão mental, letargia, convulsões, arritmia, entre outros, uma vez que a condução de impulsos nervosos e contração muscular por exemplo são mediados por passagem de íons.

Contração muscular:

Esse processo, ATP dependente, ocorre por meio do encurtamento das fibras musculares, conseqüência do deslocamento dos filamentos de actina sobre filamentos de miosina II. As unidades repetidas das miofiblilas das células musculares estriadas, os sarcômero, são compostas por actina associada a outras duas proteínas (tropomiosina e troponina), formando os filamentos delgados e filamentos espessos, de miosina II. O conjunto de miofibrilas (fibra) é envolvido por uma membrana o sarcolema, que inclui o sarcoplama, mitocôndrias e o retículo sarcoplasmático.







Os íons cálcio são os responsáveis pela atração entre os filamentos de actina e miosina, numa etapa em que essas proteínas deslizam uma sobre a outra com gasto energético. Após esse mecanismo os íons de cálcio são bombeados novamente para dentro do retículo sarcoplasmático, aguardando um novo potencial de ação e pondo fim à contração muscular.

Para uma visão mais detalhada do processo acesse:


http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/videos/contracao-muscular-3.php


Em pacientes com déficit grave de nutrientes, a produção de energia se encontra enormemente prejudicada. Assim, pode ser que não haja ATP suficiente para promover essa recapituração de cálcio, e a contração muscular ocorre de forma continuada. Entende-se dessa forma alguns dos sintomas citados anteriormente. A falência da bomba de cálcio promove o acúmulo no citoplasma (escape das mitocôndrias e do retículo endoplasmático). O cálcio promove a ativação de diversas enzimas. Estas enzimas ativadas promovem a inativação do ATP (ATPases), lise das membranas celulares (fosfolipases), lise das proteínas estruturais e das membranas (proteases) e fragmentação da cromatina (endonucleases).
O mesmo raciocínio usado acima pode ser usado para entender os efeitos do desequilíbrio entre as concentrações de sódio e de potássio, mantida pela bomba de sódio e potássio por transporte ativo. A capacidade da transmissão do impulso nervoso, nada mais que a despolarização da membrana, em neurônios está na capacidade da membrana celular de permitir concentrações diferenciadas dentro e fora da célula de determinados íons, como sódio e potássio. Com o aumento da concentração sódio na célula, se estabelece um edema intracelular, caracterizado por um acúmulo de água dentro da célula.


Hipovitaminose


Vitaminas são substâncias vitais para o funcionamento homesostático e regulação do metabolismo, mas apesar disso não são produzidas pelo organismo, pelo menos não em concentrações consideráveis. A maioria das vitaminas atua como coenzimas, se ligando a proteínas e ativando sítios enzimáticos destas, para catalisar reações de transferência de energia ou metabólicas. Indivíduos com níveis avançados de desnutrição apresentante condição de hipovitaminose, causa de diversas doenças e sintomas, em alguns casos irrevessíveis, se manifestados em tecidos como a cornéa e neurônios. Dado o grande número de vitaminas e um número maior ainda de consequencias relacionadas com o seu déficit, serão feitas apenas algumas abordagens relacionadas ao tópico.


Hipovitaminose K:


O principal papel da vitamina K é na modificação pós-translacional de vários fatores de coagulação do sangue, onde serve como coenzima na carboxilação de certos resíduos de ácido glutâmico presentes nestas proteínas para formar um aminoácido presente nos fatores de coagulação e ainda regula a deposição de cálcio na matriz óssea. A vitamina K influi, ainda, na síntese de proteínas presentes no plasma, rins e talvez outros tecidos. Como efeitos da falta de vitamina K há uma tendência a hemorragias intestinais, equimoses, epistaxes, hemorragias pós-operatórias, em geral problema relacionados com deficiência da coagulação sanguínea. É estudado que a hipovitaminose K pode estar relacionada também com hemorragias retroplacentárias de abortamentos habituais.


Hipovitaminose C:


É essencial para a síntese de colágeno, fibra principal do tecido conjuntivo uma das substancias mais abundantes no organismo. O mecanismo de síntese de colágeno é resumidamente o seguinte: “A vitamina C, ativa dentro da célula, hidroxila (adiciona hidrogênio e oxigênio) dois aminoácidos: a prolina e a lisina. Isso ajuda a formar uma molécula precursora chamada procolágeno, que é mais tarde mudada para colágeno, fora da célula.” Sem essa vitamina esse processo não ocorre. O ácido ascórbico (vitamina C) atua também na formação dos dentes e ossos, na funcionalidade do sistema imune, prevenindo gripes e infecções, e protege vasos sanguíneos. A deficiência de vitamina C causa (principalmente) a doença conhecida como escoburto, caracterizada por hemorragias nas gengivas, inchaço, dores nas articulações, feridas que não cicatrizam e pouca segurança na fixação dos dentes.


Hipovitaminose B


Tiamina: atuante no sistema cardíaco, nervoso (raciocínio) e muscular. Sua falta causa o chamado béri-béri, cujos sintomas somados aos diversos problemas causados pelo hipovitaminose dessa vitamina são: insônia, nervosismo, irritação, fadiga, depressão, perda de apetite e energia, dores no abdômen e no peito, sensação de agulhadas e queimação nos pés, perda do tato e da memória, problemas de concentração.


Riboflavina: se relaciona com o metabolismo energético (essencial na síntese de FAD) e com a saúde dos olhos, pele, boca e cabelos. Se defiente no organismo, os seguinte sintomas se manifestam: rachaduras nos cantos da boca e nariz, estomatite, coceira e ardor nos olhos, inflamações das gengivas com sangramento, língua arroxeada, pele seca, depressão, catarata, letargia e histeria.


Cobalamina: necessária para a formação dos eritrócitos, no metabolismo dos aminoácidos e ácidos nucléicos e manutenção do sistema nervoso. Sua carência se reflete em anemia e alterações neurológicas


Para saber mais sobre os efeitos da falta de vitaminas no organismo acesse: http://www.medicosdeportugal.pt/action/2/cnt_id/1166/


Saúde Mental


A descoordenação das concentrações de íons nos espaços celulares apropriados acarreta uma grande alteração na liberação de neurotransmissores e passagem de impulsos elétricos. Alterações dos neurotransmissores cerebrais podem gerar alterações na percepção e comunicação do SNC. Em função disso é possivel que pessoas antes completamente saudáveis experienciem alucinações e confusão mental. Veja o que diz Geraldo Medeiros, médico da USP:


“Existe uma sensação de bem estar e mesmo de euforia após os primeiros 3 a 4 dias, possivelmente pela intoxicação cerebral pelos corpos cetônicos. Alucinações, de curta duração, são freqüentes e visões já foram relatadas. O misticismo se exacerba e a inspiração para exposição de idéias, escrever textos, explicar teorias complexas e resolver os problemas locais e universais surge como subproduto da falta de nutrição”


Anorexia e Bulimia

Talvez as doenças que melhor revelam os limites físicos e psicológicos do corpo humano diante da falta de nutrientes e líquidos são as disfunções alimentares, entre as quais estão a anorexia nervosa e a bulimia. Não estendendo a discussão para as causas e conseqüências psicológicas destas doenças, seus reflexos no corpo são bastante visíveis e impressionantes. Anoréxicos vivem em condições de fome auto-induzida, com taxas de gordura corporal extremamente baixas e deficiência grave de nutrientes.

Em mulheres, um dos principais sintomas é a amenorréia, ou ausência de menstruação. O colesterol é a molécula básica para a formação dos hormônios esteróides que regulam o ciclo menstrual, e de estrógeno. Talvez não seja a falta de menstruação em si o problema, mas a causa dessa falta. O estrógeno é um hormônio de múltiplas funções no organismo. Além de induzir a proliferação celular, está relacionado ao equilíbrio entre as gorduras no sangue, á fixação e deposição de cálcio nos ossos, ao desenvolvimento das células nervosas à proteção e manutenção saudável do sistema cardiovascular (é provado que mulheres que entram na fase de menopausa (baixo níveis de estrógeno) tem uma probabilidade maior de sofrer ataques cardíacos e doenças cardio-vasculares).Acredita-se que este ultimo ponto seja em função de sua capacidade de diminuir a formação de coágulos sanguíneos e os níveis de LDL no plasma.

Estrógeno e os ossos

Há um equilíbrio entre as concentrações de cálcio presentes no sangue e encontradas nos ossos. Em condições normais, a troca de um depósito para o outro é feita em taxas iguais, o que garante deposição sufuciente tanto na corrente csanguinea quanto nos ossos. Porém, quando a quantidade de calcio no plasma é muito baixa, a capacidade de absorção de calcio sanguineo supera o seu depósito no esqueleto, resultanto em perda de massa óssea. Isso ocorre devido à necessidade do organismo de manter concentrações adequadas de calcio no sangue, um vez que órgãos vitais, como o coração, os rins, o cérebro e o sistema gastrointestinal depende da subatancia. Para entender a função do estrógeno na saúde dos ossos pode-se fazer uma comparação com mulheres que entraram na menopausa, já que nesse período, os baixos niveis de estrógeno no organismo são a principal causa de osteoporose. Sendo assim, a amenorréia é um alerta. Nessa condições os ossos mais finos do corpo se tornam mais frágeis e suscepitíveis a fraturas, em função da perda da densidade óssea (combinação da baixa ingestão de cálcio e da falta de sintese de estrógeno)



Uma hidratação ineficiente, típica de pacientes anoréxicos, que se privam até mesmo da ingestão de líquidos, pode levar também à falencia renal e ao desequilíbrio eletroquimico, do qual decorre uma alteração dos batimentos cardíacos (arritimia). Há um aumento considerével no risco de convulções devido á desidratação e á acidose sanguínea pelos corpos cetônicos.

Alterações dos neurotransmissores cerebrais podem gerar alterações na percepção e comunicação do SNC, prejudicando a memória e o processamento de informações, podendo até mesmo causar delírios. É possível associar também danos cerebrais permanente e hipóxia das células nervosas. A grande perda de tecido adiposo estabelece a condição de hipotermia, diminuindo o tempo de resposta do organismo e dos reflexos, causando letargia e confusão e até alucinações. Na tentativa de manter um corpo anoréxico vivo o organismo diminui o ritmo cardíaco e respiratório, a pressão sanguínea e a temperatura, promove mudanças hormonais, diminuindo os níveis de hormônios tireóideos e enfraquecimento do sistema de defesas do organismo. Veja um quadro geral das consequências da anorexia:

Morrer de fome... Dói?


Há uma enorme variação nas opiniões médicas a respeito desse assunto. O consenso reside no fato de que privar uma pessoas de líquido e comida causa a morte com cerca de 15 dias. A falta de fluidos corporais impede os rins de produzir quantidades necessárias de urina e paulatinamente o corpo vai sofrendo acúmulo de toxinas. Com o balanço químico do corpo interrompido ou largamente prejudicado afeta diretamente o sistema de comunicação elétrica do organismo. Finalmente o coração pára.


O caso de Terri Schiavo causou enorme comoção na mídia e uma ampla discussão entre especialista a respeito de seus sintomas durante os últimos 12 dias de sua vida, quando foi lhe negado qualquer suplemento alimentar. Aqueles que acreditam numa morte tranqüila relatam:


Dr. Linda Emanuel, fundadora do Education for Physicians in End-of-Life Care Project at Northwestern University: “pelas informações disponíveis, não é de forma alguma uma coisa horrível”... “Ela provavelmente não sente nada” (em decorrência de um estado vegetativo constante)


Dr. Sean Morrison, professor de geriatria e cuidados paliativos da Escola de Medicina do Monte Sinai em Nova Iorque: “Eles geralmente entram uma espécie de coma tranqüilo... É muito calmo, muito digno. Muito gentil.”.


Kenneth Goodman, diretor de bioetica da University of Miami School of Medicine e co-direcor da Florida Bioethics Network: “A retirada dos tubos de alimentação é uma prática comum... Logo após a negação de alimento para o cérebro, o mesmo começa a produzir substancias químicas que funcionam como um anestésico natural. Ela não está sentindo nada. O medicamento contra dor que Schiavo está recebendo é para garantir que se houver alguma dor, ela é adquadamente ministrada”


Em contrapartida, há aqueles que apontam o sofrimento de Terri, aformando que ela estava consciente e sentindo dor, apesar da falência de alguma funções cerebrais:


Dr. Lieberman, da UCLA Medical Center: “Quando o corpo está faminto, ele tem que se auto-digerir para fornecer energia para as funções vitais. A perda de peso pode atingir 50%, o que significa que Terri se tornará um esqueleto vivo. Eventualmente, seu coração e pulmões irão parar – a não ser que antes ela seja acometida por uma infecção em decorrência de sua imunidade comprometida. A privação total de alimentos é fatal de 8-12 semanas. Negando a Terri água, ela irá morrer mais cedo – talvez dentro de duas semana, após ansiedade, convulsões, queda de pressão sanguínea, confusão mental e coma. Duas semana é um longo tempo para sofrer.


Cheryl Ford, uma enfermeira que esteve empenhada em salvar a vida de Terri tem uma opinião compatível com a do Dr. Lieberman. Para ler seu relato acesse: http://cureltd.blogspot.com/2004_09_01_archive.html.


Há um caso interessante nos Estados Unidos. Enter Kelly Taylor, uma mulher de 28 anos em estado não terminal, sentiu na própria pele uma experiência semelhante a de Terri Schiavo. Veja:


"Enter Kelly Taylor, a 28-year-old woman who is not terminally ill, has ended her attempt to starve herself to death after 19 days because of the pain of the effects of starvation. Mrs. Taylor claimed that she had chosen self-starvation as the only method of suicide that would not leave her husband Richard liable for prosecution. Nevertheless, after 19 days, she said, "It has become too uncomfortable and I would not wish what I have been going through on my worst enemy." Taylor suffers from a congenital heart condition known as Eisenmenger Syndrome which, despite being labeled so by news media, is not a terminal condition. It does, however, reduce her mobility and leaves her dependent upon oxygen. She said her reason for wanting to die was that, as a disabled person, she could no longer make a "contribution" to society. Opponents of euthanasia have repeatedly pointed out that the utilitarian values which permeate modern society are likely to encourage sick and disabled persons to think of themselves as "useless" and "burdensome." At a press conference, Mrs. Taylor said, "I feel disappointed in myself. I really wanted to die and that seemed to be my only option. I regret that I have to stop what I am doing because I still want to die. But starvation, as it turns out, is very undignified." The painful and "undignified" death rejected by Mrs. Taylor, however, was inflicted successfully by Michael Schiavo and his euthanasia activist lawyer, George Felos, on Schiavo's estranged wife, Terri, both of whom insisted that Terri's death by starvation and dehydration was painless and easy. Terri was also not suffering from any terminal illness and apart from her cognitive disability, was in good health. The news media's active collusion in this deception is evident in the UK Telegraph's coverage of Mrs. Taylor's campaign to kill herself, in which it called her a "terminally ill" woman in the first sentence. The Telegraph reluctantly admits at the end of the article that Eisenmenger Syndrome is "not technically a terminal illness." During the fight to save Terri Schiavo's life, the great majority of news media dutifully called her "terminally ill" and repeated Schiavo and Felos' claims that her death was painless and easy despite the extensive regimen of pain drugs required. Earlier this year (2005), in comments on the Schiavo case, Dr. David Stevens, spokesman for the Christian Medical Association said that death by dehydration is horrific. Dr. Stevens, speaking from his 13 years experience in Africa, where the most common cause of death in children is dehydration from gastroenteritis, said, "Contrary to those that try to paint a picture of a gentle process, death by dehydration is a cruel, inhumane and often agonizing death."

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Alostasia - novo conceito - curiosidades

Olá. O professor Marcelo sugeriu a divulgação de um novo conceito na Bioquímica do Estresse. Resolvi acatar: a ALOSTASIA.

Segue uma dissertação a respeito, bastante interessante.
dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/1884/14434/1/Katherinne%20Maria%20Spercoski.pdf

domingo, 15 de junho de 2008

Hipóxia

Hipoxemia é o teor reduzido da concentração de oxigênio no sangue arterial, o que leva a hipóxia, que é a baixa disponibilidade de oxigênio para os tecidos orgânicos. A hipóxia pode ocorrer tanto se houver quantidade normal de oxigênio no sangue arterial (neste caso há uma alteração nos mecanismo de transporte de oxigênio para órgãos específicos, que é chamada de hipóxia em tecido, e exemplos desta são o infarto agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral) quanto se a quantidade de oxigênio ficar reduzida nos vasos arteriais (esta é chamada de hipóxia generalizada e afeta o corpo todo, ela acontece se, por exemplo, houver deslocamento do indivíduo para áreas com concentrações baixas de oxigênio no ar).

A nível celular, a carência de oxigênio provoca alterações diretas nas mitocôndrias, ocasionando diminuição da fosforilação oxidativa (principal meio de obtenção de energia da célula) e, conseqüentemente, dos níveis de ATP. Na ausência de produção de energia através da fosforilação oxidativa, a célula utiliza outras vias energéticas para formar o ATP, uma delas é a via glicolítica anaeróbica. Entretanto, a redução do pH citossólico - que decorre da intensa produção de ácido lático decorrente de fermentação lática (atividade glicolítica anaeróbica que células humanas costumam fazer na ausência de oxigênio) - da célula em busca de energia ajuda a digestão celular pelas próprias enzimas lisossômicas (enzimas que são encontradas no citoplasma em condições normais, mas que não são ativas por causa do pH neutro deste). Além disso, como essa via não é tão eficiente, a quantidade da biomolécula substrato dela, ou seja, de glicose, começa a diminuir drasticamente sem produção de energia compensatória. As conseqüências do uso incessante de fermentação lática em células que costumam obter sua energia por respiração aeróbia são falta de energia, que levará a uma série de mudanças metabólicas e morfológicas na célula, e digestão enzimática dos componentes celulares por enzimas lisossomais, ambas ocasionam morte celular.

Diante do quadro de hipóxia e da falta de energia decorrente desta, primeiramente a atividade da ATPase Na+/K+ dependente é bloqueada, o que leva a célula a uma completa perda da homeostasia iônica. Ocorre, então, influxo de Na+ para o citoplasma e por osmose também ocorre tumefação celular (rápida entrada de água para o interior da célula). Até aqui, os danos celulares ainda são reversíveis. Em seguida, a célula torna-se edemaciada, com bolhas na membrana plasmática, perda de microvilos e desagregação de ribossomos do retículo endoplasmático rugoso (o que causa comprometimento da produção protéica celular). Quando a lesão evolui, são visíveis ao microscópio eletrônico (em média 30 a 40 min após o início da lesão) mitocôndrias também edemaciadas e com vacúlos em seu interior.

A ausência de ATP, que leva à inatividade da bomba de Ca++ (já que 50% dos ATPs produzidos pela célula são utilizados para a manutenção da permeabilidade seletiva das membranas), e o aumento da concentração citossólica de Na+ levam à inatividade do trocador de Na+/Ca++, com isso há aumento da quantidade de Ca++ citoplasmático. No citoplasma o Ca++ é responsável por ativar enzimas autolíticas como proteolases, endonucleases e fosfolipases danificando completamente a célula.

A digestão da célula pelas próprias enzimas lisossômicas, como já foi citado acima, também é ajudada pela redução do pH citossólico. Nesse estágio, instauram-se eventos de lesão celular irreversível, atuando principalmente nas membranas. Há uma perda contínua de proteínas, enzimas e ácidos ribonucléicos (RNA), essenciais para a célula. Membranas lisossômicas são rompidas, levando ao extravasamento das enzimas lisossomais para o citoplasma. Essas enzimas provocam digestão enzimática dos componentes celulares, ocasionando a morte celular por autólise. Portanto, a isquemia provoca lesões reversíveis e irreversíveis, as quais são devidas principalmente à alteração dos níveis de ATP e do íon cálcio. Este, inclusive, é um importante mediador das alterações bioquímicas e morfológicas que levam à morte celular, vinculado diretamente ao dano nas membranas celulares.

Uma célula que tenha sofrido lesão reversível causada pela hipóxia pode ser levada à morte caso a oferta de O2 seja restabelecida de súbito. Esse fenômeno é chamado de lesão por reperfusão e a sua causa é a realização da fosforilação oxidativa por mitocôndrias semi-danificadas por hipóxia, o que provoca uma intensa liberação de radicais livres (principalmente ânions superóxidos). Além disso, é possível que a hipóxia prejudique as vias de detoxicação de radicais livres como os antioxidantes (vitaminas A, C e E; e glutatião citosólico) e as enzimas catalases, superóxido dismutases e glutatião peroxidase.

O Hormônio Eritropoietina (que é uma glicoproteína) é produzida em estados de hipóxia. Este hormônio induz a produção de eritrócitos (glóbulos vermelhos), entretanto, essa resposta leva alguns dias para ter ação plena.

Órgãos como cérebro e coração possuem elevado metabolismo, desta forma, a capacidade de adaptação à hipóxia desses órgãos é bastante limitada. Com pressões parciais de oxigênio no sangue arterial (PaO2) abaixo de 40 mmHg, já se inicia o processo de lesão neuronal. A não resolução do distúrbio faz com que a lesão assuma caráter irreversível. Encefalopatia hipóxicaé a condição em que há diminuição no suprimento de oxigênio ao cérebro ou partes dele apesar do fluxo adequado de sangue (diferenciando de isquemia cerebral). Pode ser causada por afogamento, estrangulamento, envenenamento por monóxido de carbono e complicações anestésicas. O cérebro é especialmente sensível porque ele usa cerca de 20% do oxigênio total do corpo humano. A hipóxia miocárdica acarreta a redução da contratilidade e conseqüente redução do débito cardíaco. Uma vez que ocorre diminuição do débito cardíaco, a oferta de oxigênio fica diminuída para todo o resto do corpo.

Para cada década de vida acima dos 60 anos de idade, a pressão parcial de oxigênio no sangue arterial normal reduz-se cerca de 10 mmHg. A hipoxemia pode ser classificada em discreta, moderada ou grave levando-se em conta diferentes aspectos. A observação da pressão alveolar de oxigênio é a que mais facilmente identifica a causa da hipoxemia.

A maioria das manifestações clínicas próprias da hipoxemia são agitação, taquicardia e taquipnéia. A cianose é fenômeno tardio e sujeito a grande variação individual de percepção.

Oxigênio é administrado ao paciente para tratamento de hipóxia. O objetivo é elevar a pressão parcial de O2 do sangue arterial. Técnicas como a cânula nasal (um tubo com pontas que são inseridas nas narinas) fornece concentrações de 24% a 35% de O2, a até 4 L/min.
A máscara facial descartável fornece concentrações mais altas, 30% a 55% de O2, a 6 até 10 L/min. Em casos extremos de inalação de fumaça e edema pulmonar, 100% de O2 podem ser fornecidos usando-se uma máscara respiratória unidirecional com uma bolsa reservatório (com esta máscara, o paciente inspira O2
puro da bolsa e expira através de aberturas de exalação).

Em alguns casos, terapia hiperbárica, que envolve exposição ao oxigênio a pressões acima da pressão atmosférica, é necessária. Entretanto, a terapia por oxigênio envolve alguns riscos. Quando administrado por longos períodos, o oxigênio tem efeitos tóxicos. Concentrações muito altas de oxigênio podem resultar em colapso dos alvéolos (atelectasia).

Terapia hiperbárica: O paciente é colocado em uma câmara selada que contém oxigênio puro a pressões de 2 a 2,5 atm por períodos de até 5 horas. A alta pressão parcial de oxigênio resultante aumenta a quantidade de oxigênio dissolvido no sangue. Terapia hiperbárica por oxigênio alivia a hipóxia em casos de envenenamento por monóxido de carbono.

Existem tipos de hipóxia classificados de acordo com cada causa. Entre eles, destacamos:

Hipóxia Hipóxica (de altitude): Resulta de uma troca gasosa inadequada na membrana capilar-alveolar. Isso pode ser causado por uma quantidade de oxigênio inadequada no ar inspirado, por defeito na ventilação ou por uma obstrução das vias respiratórias. Um suprimento deficiente de oxigênio para o sangue resulta em uma deficiência de oxigênio para os tecidos. Isso representa a causa mais comum de hipóxia encontrada na altutide e pode se tornar aparente acima de 3.000 metros acima do nivel do mar (já que a zona de vida normal é considerada até 3.000 metros de altitude).

Hipóxia Hipêmica (anêmica): Acontece devido à redução da capacidade carreadora de oxigênio da hemoglobina. As causas desta forma de hipóxia incluem anemia, perda sangüínea, envenenamento por monóxido de carbono, medicamentos à base de sulfa e tabagismo excessivo.

Hipóxia Estagnante: É uma deficiência de oxigênio no corpo devido à circulação pobre. Isto pode acontecer quando o débito cardíaco não satisfaz as necessidades teciduais. Outras causas de hipóxia estagnante incluem coleção venosa, espasmo arterial, oclusão de um vaso sangüíneo ou longos períodos de respiração por pressão pos
itiva.

Hipóxia Histotóxica: é a incapacidade dos tecidos corporais em utilizar o oxigênio disponível. O envenenamento por cianeto e monóxido de carbono (que reduz a capacidade da hemoglobina em se combinar com oxigênio), ingestao de alcool e narcóticos podem resultar em hipóxia histotóxica.


Curiosidades: O treinamento em hipóxia foi introduzido nos treinos de natação por Doc Counsilman. Embora haja algumas interpretações controversas, o trabalho auxilia significativamente na manutenção da estabilidade técnica dos nadadores em situações de adversidades fisiológicas. O treinamento hipóxico envolve a redução ou eliminação da respiração durante determinada série. Algumas teses indicam que o treinamento hipóxico aumenta a habilidade dos músculos em trabalhar com a baixa de oxigênio como em uma situação de parte final da prova de 200 livre. Também existem teses de que a diminuição do número de respirações do nadador poderá aumentar a sua velocidade, por conta da mudança da posição do corpo para a tomada do ar aumentando a resistência.